Trabalho Infantil é Crime!

Comunidade

 

Bola de gude, peteca, peão, boneca e queimada não são brincadeiras que fazem parte do cotidiano de muitas crianças no Tocantins. Apesar de o Estado apresentar uma melhora gradativa em seu IDH, Índice de Desenvolvimento Humano (O IDH classifica a qualidade de vida de uma região de acordo com os índices como saúde, educação e renda), avançando do 18º (1991) para o 14º lugar (2010), saindo de um IDH de 0,525 para 0,699, porém, ainda bem abaixo da média nacional, que é de 0,727.  Segundo a Secretária Executiva do CEDECA (Centro de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente), Mônica Brito, o Tocantins ainda apresenta um elevado índice de trabalho infantil, ocupando o décimo quinto lugar no ranking nacional com uma taxa de ocupação de 8,6% entre as crianças de 5 a 17 anos conforme a PNAD-IBGE 2014.

O CEDECA Glória de Ivone -Tocantins é uma organização de direitos humanos que controla e monitora a execução das politicas públicas desenvolvidas pelo poder executivo, nos âmbitos estadual e municipal. “Nós damos visibilidade à questão do trabalho infantil, e exigimos do estado uma agenda politica, que faça um enfrentamento, que diz respeito à proteção, investigação e a fiscalização” afirmou a secretária. Mônica ressaltou ainda que “é fundamental o papel do estado na coordenação da ação de integração entre a Secretaria do Trabalho e Assistência Social, o Ministério do Trabalho e Conselhos Tutelares para conscientizar e desmistificar a cultura de que o trabalho infantil edifica e que as crianças que não trabalham vão para o crime”.  

Entretanto é bem recente relacionar esse tipo de exploração econômica com as formas de violência a que estão submetidas às crianças e adolescentes nessa situação.  Segundo o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), art. 60, trabalho infantil é todo o trabalho realizado por pessoas que tenham menos da idade mínima permitida para trabalhar. No Brasil, o trabalho não é permitido sob qualquer condição para crianças e adolescentes entre zero e 13 anos; a partir dos 14 anos pode-se trabalhar como aprendiz; já dos 16 aos 18, as atividades laborais são permitidas, desde que não aconteçam das 22h às 5h, não sejam insalubres ou perigosas e não façam parte da lista das piores formas de trabalho infantil.

O trabalho infantil vem sendo pesquisado, denunciado e enfrentado como uma das piores formas de exploração econômica que obriga crianças e adolescentes a exercer funções e assumir responsabilidades de adultos, impróprias ao seu desenvolvimento nessa etapa da vida. Segundo Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD 2015), feita pelo IBGE, o trabalho infantil na faixa dos 5 a 15 anos de idade caiu de 2,82 milhões em 2004 para 1,06 milhão em 2015, onde 69,71% (741.796) dos trabalhares infantis são meninos e 30,29% (323.321) são meninas.

São cinco os direitos que toda criança e todo adolescente brasileiro devem ter:

Vida e à saúde; Liberdade, respeito e dignidade; Convivência familiar e comunitária; Educação, cultura, esporte e lazer; Profissionalização e proteção no trabalho.

bateia

A maior incidência do trabalho infantil apontada pela pesquisa em âmbito nacional em 2015 ocorre no contexto urbano com 51,89% (552.17) contra 48,11% (551.947) dos casos identificados no campo. Em 2015 a PNAD apontou o ramo da agricultura como o principal setor de atividades com 48,07% dos casos.

O ECA.

A “PRIORIDADE ABSOLUTA” no desenvolvimento integral de crianças e adolescentes é uma responsabilidade da família, da sociedade e do Estado, conforme determina a Constituição Brasileira. Uma análise realizada pelo Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância) no “Caderno Brasil (2008)” mostra que 31,5% dos brasileiros vivem em situação de pobreza; entretanto, se feito um recorte apenas da população até 17 anos, o percentual sobe para 50,3%. Esse dado é apenas uma das possíveis aproximações entre os problemas sociais do País e sua relação direta com a necessidade de investir no desenvolvimento de meninos e meninas. O ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (ECA) é uma Lei de 1990, que normatiza o artigo 227 da Constituição Federal de 1988. O Estatuto surgiu a partir da mobilização social que deu origem ao Fórum Nacional de Entidades Não-Governamentais de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente (Fórum DCA). O ECA é tido como um marco para os direitos da criança e do adolescente no Brasil, substituindo o Código de Menores. Traz em sua base a doutrina de proteção integral, reforça o princípio da criança e do adolescente como “prioridade absoluta” e institui o Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente (SGD). Proteção integral – a Lei entende que todas as crianças e adolescentes são sujeitos de direitos e passam a ser considerados cidadãos em fase peculiar de desenvolvimento

O Trabalho Infantil no Tocantins.

A PNAD identificou 14.028 crianças trabalhando irregularmente no ano de 2014 em todo estado. Já no ano de 2015 os casos diminuíram para 7.095. Desses 7.095 casos registrados no Tocantins, 760 das crianças tinham de 5 a 9 anos. 1.774 de 10 a 13 anos e o maior número de casos foi registrado na faixa etária dos 14 a 15 anos com 4.561 ocorrências. A pesquisa demonstra que os meninos sofrem mais com esse tipo de exploração, pois são 71,43% dos casos. A agricultura aparece também em primeiro lugar dentre os setores de atividades que exploram a mão de obra infantil no estado com 49,96% casos registrados. Os maiores índices do trabalho infantil do Tocantins estão entre as famílias com renda per capta entre R$ 154,00 a 308,00 (39,28%). O perfil do trabalho infantil traçado pela PNAD 2015 para o Tocantins, diz que a média de horas trabalhadas semanalmente é de 23,20 horas, e que a renda média mensal não ultrapassa um terço do salário mínimo (R$ 275,41). 89,30% dessas crianças ocupadas estão na escola e 71,43% são do sexo masculino. 35,72% vivem na cidade e 64,28% moram no campo. 49,96% das crianças desempenham atividades rurais e 50,04% atividades urbanas.

O Trabalho Infantil doméstico

O trabalho infantil doméstico no Brasil é um fenômeno de larga extensão, decorrente de causas complexas referendadas por mitos culturais que legitimam e ocultam condição de exploração da criança e do adolescente”, afirmam Josiane Rose Petry Veronese e André Viana Custódio autores do livro Trabalho Infantil Doméstico no Brasil. O trabalho infantil doméstico, em particular, fere o direito à vida e a saúde; à liberdade, ao respeito e à dignidade; à convivência familiar e comunitária; à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer e à profissionalização. E, muitas vezes, ainda expõe as meninas a situações de negligência, discriminação, abuso sexual, crueldade e opressão.

   Aspectos culturais da sociedade brasileira, arraigados através de um sistema de crenças, valores e tradições, favorecem a perpetuação da inserção da criança no trabalho produtivo. Apoiados num discurso de que o trabalho assume características de elemento formador, educativo e disciplinador, usam com desculpa a exploração da mão de obra infantil como competência para afastar a criança da ociosidade, da criminalidade e da vagabundagem. A desinformação e a crença popular de que o trabalho doméstico infantil não traz perigo e que se trata, inclusive, de uma atividade desejável, é o maior risco para proteger os meninos, meninas e adolescentes imersos nestas atividades. Os riscos existentes fazem com que diversos países o classifiquem entre os trabalhos perigosos que estão proibidos para menores de 18 anos, em virtude do Artigo 3º da Convenção nº 182 sobre as piores formas de trabalho infantil. No Brasil, o Decreto nº 6.481, de 12 de junho de 2008 regulamenta os artigos 3º, alínea “d”, e 4º da referida convenção.

De acordo com a Setas, os principais tipos de riscos e os perigos potenciais no trabalho doméstico infantil são:

*  Longas horas de trabalho

* Trabalho físico pesado

* Abuso físico ou emocional

* Abuso sexual

* Precárias condições de vida

* Baixas remunerações ou somente moradia, alimentação etc.

* Falta de oportunidades educativas

 * Ausência de oportunidades para o desenvolvimento emocional e social

O Conselho Tutelar

O Conselho Tutelar é um dos principais alicerces do Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente, sendo encarregado de zelar pelos direitos da criança e do adolescente, conforme Lei Federal nº. 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA). A função dos Conselheiros Tutelares é prestar serviço à sua comunidade na prevenção, apuração e encaminhamento aos órgãos competentes de toda forma de violação dos direitos da criança e do adolescente, com ênfase no trabalho infantil. Além de encaminhar a resolução de casos que necessitam de investigação e intervenção da polícia, da justiça, ou de ações na área de serviço social, o Conselho Tutelar tem, de acordo com o Art. 136 do ECA, tem o poder de atender e aconselhar os pais ou responsáveis, aplicando as medidas como encaminhamento a programa de proteção à família, a tratamento psicológico ou psiquiátrico, emitir advertência e até mesmo cobrar a obrigação de matricular os filhos na escola e acompanhar sua freqüência e aproveitamento escolar. No combate a exploração ao trabalho infantil, este papel preventivo é fundamental no sentido de conscientizar pais e responsáveis para os malefícios da prática, bem como de cobrar a permanência das crianças ou adolescentes na escola como forma de evitar o trabalho precoce. Outro papel fundamental dos Conselhos Tutelares é requisitar sempre que se fizer necessário os serviços públicos nas áreas de saúde, educação, serviço social, previdência, trabalho e segurança, todos indispensáveis ao encaminhamento de soluções para cada caso, seja no direcionamento, seja no acompanhamento. Assim, é extremamente necessário que os conselhos tutelares tenham, de fato, autonomia perante os órgãos governamentais, para que possam atuar com presteza no combate às omissões do poder público perante essa parcela da população que segundo a legislação deve ser considerada prioridade absoluta.

O CRAS

O CRAS (Centro de Referência e Assistência Social) é uma unidade pública estatal descentralizada da política de assistência social sendo responsável pela organização e oferta dos serviços socioassistenciais da Proteção Social Básica do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) nas áreas de vulnerabilidade e risco social dos municípios e DF. O CRAS possui o serviço de convivência e fortalecimento de vínculos que atende principalmente as crianças em situação de vulnerabilidade, um dos públicos alvo desse serviço são as crianças e adolescentes retirados do trabalho infantil.

A Rede De Proteção

“A rede de proteção é composta por todos aqueles que podem identificar o trabalho infantil e ofertar algum tipo de assistência a essas crianças retiradas do trabalho infantil e suas famílias” explicou a Técnica da gerência de proteção especial da Setas  (Secretaria do Trabalho e Assistência Social) Raquel Secunde. A setas tem a função de dar apoio técnico aos municípios por meio de capacitações, ações de mobilização e conscientização, audiências públicas e oficinas nas escolas de todo estado. A técnica reafirma a importância do conceito de rede de proteção na erradicação do trabalho infantil: “a assistência social não vai trabalhar sozinha, a educação não vai trabalhar sozinha, nós precisamos dessa aproximação dos programas de aprendizagem, conversar, dialogar, para combater um problema que é de toda sociedade”.

Políticas Públicas

Desde o ano de 2013 a Secretaria do Trabalho e Assistência Social (SETAS) em parceria com o Fórum Estadual de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FETIP) e o Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI), vem realizando audiências públicas em todo estado com o objetivo de debater a problemática do trabalho infantil no Tocantins, reunir as diversas esferas do poder público e principalmente sensibilizar e envolver a sociedade da luta contra a exploração econômica de crianças e adolescentes. O envolvimento da Setas e do Ministério Público do Trabalho é fundamental para a interlocução entre os diferentes órgãos do governo, bem como na manutenção de programas como o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti) e no desenvolvimento de ações preventivas como os Pioneiros Mirins e Tocantins Sem Fome. Outras ações como o Encontro Estadual das Ações Estratégicas do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Aepeti) contam com a parceria do Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário (MDSA) e da Organização Internacional do Trabalho (OTI). Para debater as questões culturais envolvidas na manutenção do trabalho infantil; a forma de atuação da rede de proteção e defesa dos direitos da criança e adolescentes e também da importância da conscientização da sociedade, foi realizado o I Seminário Estadual de Erradicação do Trabalho Infantil em junho de 2016.

Como Denunciar o Trabalho Infantil

Ao se deparar com qualquer tipo de trabalho infantil irregular não pense duas vezes, faça parte da rede de proteção e erradicação do trabalho infantil: DENUNCIE!!!

No telefone: Disque 100 – o disque denúncia é gratuito e anônimo. A denúncia é registrada e encaminhada ao órgão responsável.

Na Internet: O Ministério Público do Trabalho recebe denúncias online. Basta fornecer as informações na página do MPT: www.mpt.gov.br/

Pessoalmente: Órgãos que recebem denúncias

  • Conselho Tutelar
  • Secretaria de Assistência Social
  • Delegacia Regional do Trabalho
  • Ministério Público do Trabalho

 

Por Nielcem Fernandes
Foto Destaque: Nielcem Fernandes

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